Estrutura

"A estrutura universitária não é, portanto, nem uma soma de órgãos colaterais, porque existe um escalonamento de poderes; mas não é tampouco um alinhamento de órgãos superpostos, em termos de dominação. A subalternidade é funcional, apenas destinada à articulação das vontades no sentido da unidade; e não aquela em que a vontade superior vai substituindo sucessivamente as vontades inferiores, delas prescindindo ou utilizando-as tão-somente como estruturas de execução: às de cima, as intenções, às de baixo, a execução, numa relação caracterizadora, segundo Platão, do estatuto escravocrata." (DTM, Subsídios para o plano de reforma da UFBa, p.82)

  

"Qual o órgão, na atual e superada organização da universidade, que representa essa força imanente de crescimento e revisão de suas próprias atividades? Nenhum. Ao contrário, as estruturas tradicionais conspiram a favor da acomodação e da rotina, tendendo, inclusive, a mais conciliar os interesses de pessoas e de grupos que os do ensino. O exemplo típico é o Conselho Universitário, depositário, na sistemática vigente, da função precípua de liderar a universidade. Mas a sua mecânica pende, normalmente, para o jogo de ajustes entre as escolas, cujos representantes, com igual representação, pensam nos problemas de sua escola, isolados do contexto geral; e esse desencontro de pretensões muitas vezes se resolve pelas soluções de compromisso ou de barganha, seja entre as unidades que integram a universidade, seja entre cada uma delas de per si, e o reitor, que se vale da divisão para imperar, na linha dos mecanismos de poder instalados na universidade. Algumas tentativas novas vêm sendo realizadas para reformular esses mecanismos, e uma das mais importantes é a criação dos Departamentos, nucleando objetivos e interesses acadêmicos, que escapam do controle imediato daqueles órgãos, e erigindo a sua autoridade como contraponto à administração burocrática e política tradicional. Mas isso é ainda pouco, se na própria coordenação geral e na estrutura das cúpulas não forem inseridos outros dispositivos que permitam a reorientação das linhas do poder, inclinando-o para os objetivos específicos da universidade. Pensamos que os Departamentos devem ser investidos nessa missão. É verdade que eles não se tornam eficazes por decorrência automática: o fundamental continua a ser a atitude dos dirigentes, o teor do espírito universitário e a mentalidade dos professores, tudo isso condicionado, em grande parte, pelo processo social e a consciência da integração, nele, por parte da universidade. Mas estruturas corretas propiciam e aceleram essa integração." (DTM, Subsídios para o plano de reforma da UFBa, p.46-47)

  

"A sistemática do ensino superior brasileiro pretendeu dar à universidade um governo democraticamente pluralista, cuja expressão mais alta seria o Conselho Universitário. Mas o esquema falhou. Das muitas razões explicativas, a finalidade restrita deste documento nos obriga a fixar apenas as que mais interessa ao nosso objetivo. Primeiramente, porque realiza uma política de poder; em segundo lugar, pelas circunstâncias do seu funcionamento e pela multiplicidade heterogênea de suas funções, tornou-se ele tecnicamente incompetente para decidir sobre os problemas de sua alçada. Órgão de cúpula, não poderia enveredar pela retalhada problemática do cotidiano universitário. Órgão de poder, no sentido mais amplamente político, perde-se na complicada trama de assuntos técnicos. O resultado é que, por força da natureza, ele terminou sendo aquilo que, em tais circunstâncias, poderia ser: uma autoridade distorcida, oscilando entre o político e o burocrático, e responsável por alguns dos erros, já apontados, de desfiguração dos problemas universitários, tratados na base do compromisso ou da rotina." (DTM, Subsídios para o plano de reforma da UFBa, p.63-64)

  

"O poder se absolutiza, sem a disciplina da realidade e de suas resistências. Onde os fatos não são postos com o necessário vigor, a realidade se oculta sob o fantasma das abstrações, e deixa de ser norma limitadora do arbítrio. Por outras palavras, onde os fatos são escamoteados, o poder se torna irresponsável. É esse tipo de escamoteação que pode ocorrer em órgãos como o Conselho Universitário. O limite às pretensões de cada representação não decorre de sua legitimidade, mas dos interesses, opostos, das outras escolas: a Universidade fica retalhada por esse jogo de desencontradas reivindicações. Em vez de existir uma política global nas quais as unidades se situem, acontece o inverso: desses retalhos é que se pretende tecer uma política, realmente uma política inviável em tais condições." (DTM, Subsídios para o plano de reforma da UFBa, p.64-65)