Cultura

"A Universidade, como instituição capaz de produzir um estilo diferenciado de reflexão, concorre para formar um estilo realmente universal e aberto de cultura (vocação originária da própria Universidade), e poderá tornar-se uma das mais eficientes contrapartidas à cultura tecnocrática em nossos dias. Não é preciso esclarecer que não há nada aqui contra a técnica, ao contrário, mas à dominação política e cultural baseada no confisco da razão e da cultura por uma das formas da razão, a qual, sem as outras, se torna a mais falaciosa das racionalidades. A técnica, enquanto ligada ao Fazer, está ligada também ao Ser do homem; e enquanto se mantiver intacta essa ligação, a tecné é tão nobre quanto o logos, inclusive porque os dois processos são mutuamente conversíveis. O que importa é a tecné não devorar o logos (e vice-versa), nem erigir-se em sua sucessora." (DTM, Tecnocracia e formas de poder, p. 17-18)

   

"Pelo institucionalismo formalista inerente ao temperamento brasileiro, pretende-se encontrar uma peça estrutural que, colocada dentro da engrenagem universitária, seja capaz de propiciar a cultura geral, assim como para a formação profissional, por exemplo, a universidade dispõe do mecanismo apropriado. Na realidade, não é assim. A cultura geral é mais movimento que estrutura, mais uma realização a fluir dinamicamente no dia-a-dia do conjunto, que um currículo. Ela não constitui - o que seria contraditório nos termos - uma parte da formação universitária. Não pode ser objetivo de uma cadeira, um departamento, um setor, ou mesmo de uma estrutura curricular global. Ela deve movimentar todos os setores, organizar, com elementos destes, um certo conteúdo, flexibilizado pelos elementos dinâmicos de interação com o meio e com o mundo. A cultura geral na universidade é, fundamentalmente, conexão, movimento, integração, enriquecimento, contato com o devenir da sociedade e da civilização. Costuma-se dizer que se aprende mais nos corredores da universidade que nas aulas. Por haver neles mais comunicação com a vida, e a educação não é diferente da vida, mas a sua experiência intensificada e sistemática." (DTM, Subsídios para o plano de reforma da UFBa, p.40)

  

"A posição da universidade em relação à cultura brasileira constitui, antes de tudo, um postulado de sua filosofia. Trata-se de uma atitude que deve arejar os cursos, e não um objetivo de qualquer setor especializado. A inserção nos cursos dos elementos vitais da cultura brasileira, a referência aos problemas nacionais como inspiração da atividade curricular, o gosto da experiência e dos fatos corrigindo o generalismo fácil, a preocupação do documento, o acervo bibliográfico sobre temas brasileiros, pressupõem uma redefinição do espírito universitário em nosso País." (DTM, Subsídios para o plano de reforma da UFBa, p.50)

  

"Só a lealdade, uma decente e corajosa busca de entendimentos sobre ressentimentos, da verdade sobre as verdades, do Homem acima dos homens, por uma consciência inclusiva, abrangedora, séria, poderá salvar a nossa cultura. E salva-la-á na medida em que a universidade, transformada até certo ponto na consciência crítica e profética da sociedade, estiver à altura dessa missão. Nem facilidades demagógicas, nem eriçamentos fanáticos. Estamos em plena hora da fraternidade intelectual: de novos e adultos, como já foi assinalado, como também de todas as perspectivas, de todas as buscas.

Essa fraternidade é amor, sem dúvida, na sua fonte. Mas o método que a articula, o aparelho redutor, a pesquisa fundamental que conduz ao logos, se encontra na ciência. Jamais, na civilização, a ética e a ciência precisaram tanto estar juntas. Depois dos grandes momentos de antítese - em que os impulsos morais e religiosos se impunham avassaladoramente, ou, de outro lado, só contava a ciência positiva, como assinala a história da cultura, chegou o momento da síntese. A Verdade supõe uma intenção fraterna, mas reclama um empreendimento de pesquisa. A moral, por seu lado, baseia-se no amor, mas é também uma consciência nova do homem em sua nova 'aparição'." (DTM, A universidade e sua utopia, p. 220-231)

  

"A maioria dos serviços culturais em nossas universidades se assemelham a serviços de propaganda ou de relações públicas, por lhes faltar a verdadeira perspectiva de sua missão. Cabe-lhes cuidar do essencial, e não do acessório; dedicar-se a formar, e não a distrair. A sua tarefa é desenvolver a educação, e não o diletantismo, a finura em lugar do esnobismo. Sem ater-se a uma ordem específica de atividades, o Departamento de Cultura exerce uma função complementar e integrativa, levando os estudantes a ascender do especialismo à cultura geral. Através de programas flexíveis e diversificados, deverá criar a atmosfera cultural que fora da universidade nenhuma instituição estaria apta a oferecer." (DTM, Subsídios para o plano de reforma da UFBa, p.49)

 

 "Reunindo duas atividades num só órgão, o Departamento de Cultura e Extensão faz cultura para dentro da Universidade e para fora, para a comunidade. Uma atividade é orgânica, integrativa e complementadora da própria formação universitária; outra consiste na difusão da cultura universitária para as várias camadas do povo, em bases sistemáticas porém mais flutuantes, mais ligadas às contingências, aos interesses particulares de cada setor da comunidade." (DTM, Subsídios para o plano de reforma da UFBa, p.41)